segunda-feira, 21 de julho de 2014

Novo livro revela detalhes da intensa vida de D. Pedro II

Imagem: http://en.wikipedia.org/wiki/Pedro_II_of_Brazil
Se a história fosse escrita com afeto, o imperador do Brasil D. Pedro II (1825-1891) teria um espaço reservado no “mundo dos românticos”. A historiografia recente e até a republicada, no início do novo sistema político, dedicou e dedica diversos estudos sobre o monarca. Amantes ou críticos, todos, sem exceção, mostram a simplicidade do soberano. Filho do imperador d. Pedro I (1788-1834) e da arquiduquesa da Áustria d. Leopoldina de Habsburgo (1797-1826), d. Pedro II não gostava da “pompa” comum das monarquias e revelou um traço incomum, até os dias e hoje, nos chefes de estado do Brasil: o amor pelas artes, pelas viagens e pela ciência.

Novo livro do príncipe d. Carlos Tasso de Saxe-Coburgo e Bragança, D. Pedro II na Alemanha: uma amizade tradicional, publicado recentemente pela Editora Senac, reforça todas estas caraterísticas do imperador. O foco, no entanto, são suas quatro viagens à Alemanha, duas como imperador do Brasil e uma já exilado, sem trono. O livro se divide em quatro capítulos, todos muitos bem escritos e com (muita) paixão pelo autor. Sim, não há como negar. Casado com a arquiduquesa Walburga de Áustria Toscana, d. Carlos é trineto do imperador. Viajou, pesquisou em arquivos inéditos do Brasil e da Europa procurando vestígios de seu antepassado.

A primeira viagem do imperador à Europa foi realizada entre os anos de 1871 a 1872. Por lá, desembarcou pela primeira vez no velho continente e conheceu de perto uma das culturas que mais admirava: a alemã. Antes, passou pela costa brasileira e visitou cidades nordestinas, como o Recife, em maio de 1871. Sua mulher, a imperatriz d. Teresa Cristina (1822-1889) preferiu ficar no navio na escala pela capital pernambucana. D. Pedro II pegou um trem com autoridades, conheceu a ferrovia da Caxangá – que deve ter passado pela avenida do mesmo nome nos dias atuais – e a estrada de ferro com destino ao bairro de Beberibe, na Zona Norte do Recife, e Olinda. Na volta ao navio, escreveu: “Que lindo céu. Ainda é do Brasil”. Romântico, não?

As viagens, como a do Recife, eram repletas de agendas administrativas e, digamos, culturais. Visitas às escolas, artistas locais e muitas vezes instituições de caridade. Vale lembrar que d. Carlos Tasso levanta uma comparação interessante, mas ao mesmo tempo anacrônica. D. Pedro II teria inaugurado, nestas viagens, o sistema de financiamento de viagens. Ou seja, com o salário congelado em seus 49 anos de reinado, o imperador fazia empréstimos para pagar suas despesas. Também negava qualquer tratamento privilegiado em países estrangeiros. Gostava de ser tratado como d. Pedro de Alcântara. “O imperador fica no Brasil”. Era pura simplicidade.

Na primeira viagem à Alemanha, d. Pedro II conheceu diversas personalidades, inclusive, numa escala antes na Inglaterra, teve um encontro com a “toda poderosa” rainha Vitória (1819-1901), que tinha parentes alemães. Aliás, o autor d. Carlos Tasso é primo da atual rainha dos ingleses Elisabeth II. Na terra de Goethe, d. Pedro II visitou a fábrica de armamentos Krupp, logo se tornando amigo íntimo da família que controlava a empresa. É interessante notar que o monarca, em visita às instalações, pedia diversos relatórios sobre o funcionamento de máquinas dentro da fábrica. A impressão que se tem no livro é o que o imperador poderia incomodar com tanta curiosidade. Parecia um técnico, mas estava interessado mesmo era na industrialização do Brasil.

Mas nem só de técnica vivia o imperador no estrangeiro. Na sua segunda viagem à Europa, entre os anos de 1876 a 1877, conheceu descendentes do poeta Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832), ganhando escrituras originais do alemão pelas mãos de netos, bisnetos... Também foi na Alemanha que d. Pedro II reconheceu no compositor Richard Wagner (1813-1883). Era na Alemanha, também, que o imperador visitava o túmulo de sua segunda filha d. Lepoldina (1847-1871), casada com o príncipe Luís Augusto de Saxe-Coburgo e Bragança - Duque de Saxe (1945-1907). A Alemanha era um lugar que o imperador se sentia em casa, quase como o Brasil.

Na trilha destes relatos, o livro de d. Carlos Tasso se insere em duas frentes. A primeiro é de agregar valor historiográfico a trabalhos que já contribuíram com o tema, a exemplo da biografia As barbas do imperador, de Lilia Moritz Schwarcz, agraciada pelo prêmio Jaboti. A autora brinca e chama o monarca de “imperador itinerante”, trazendo a curiosidade de ter um chefe de estado interessado pelas ciências e a cultura em geral num país escravista como o Brasil. Em outra linha, a historiadora Mary del Priore, em o recente O castelo de papel, numa biografia cruzada sobre a filha do imperador, a princesa Isabel (1846-1921) e o príncipe francês Luís Gastão – Conde d'Eu (1842-1922), chama atenção para o fato das longas viagens: a ausência de uma política de sucessão no Império. A monarquia, sim, caiu! O imperador deixou saudades e admiradores, nem que eles estejam restritos à esfera familiar ou dos leitores de história.

Por fim, a obra agrega à trajetória da família imperial brasileira. E, claro, revoluciona num sentido específico. Alguns netos da princesa Isabel, como Isabel de Orléans – Condessa de Paris (1911-2003) e d. João Maria de Orléans e Bragança (1816-2005) se dedicaram, sobretudo, às suas biografias pessoais. Ou seja, relataram momentos difíceis da família após a queda da monarquia, em 1889, no exílio, mas esqueceram de demonstrar, por vezes, a versão deles sobre os parentes do passado. Assinada por J. A. Gueiros, História de um príncipe, a biografia de d. João relata, por exemplo, que d. Pedro II era republicano. Ou ao menos, de alma republicana, influenciado, claro, pela historiografia positivista alemã. D. Carlos Tasso faz um complemento. Agrega valor a tudo isso e com documentos inéditos. É um príncipe que escreve sobre história. História que já passou, mas que é cheia de afeto e é capaz de apaixonar. história.

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