Segredo, medo, vaidade e prazer fazem o Carnaval dos mascarados
Por Renata do Amaral
Não é novidade que usar máscaras é uma das marcas registradas do Carnaval de Pernambuco, mas o que esse hábito representa? Foi em busca de se aproximar de uma resposta para essa pergunta que a professora do Instituto Federal de Pernambuco (IFPE) Maria das Graças Vanderlei da Costa realizou a pesquisa de doutorado “Lugares, tradições e rostos: máscaras no carnaval de Pernambuco, objetos que falam sem calar sujeitos” no Programa do Pós-Graduação em Antropologia (PPGA) da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
Orientado pela professora Maria Aparecida Lopes Nogueira, o trabalho foi coorientado pela professora Fátima Teresa Braga Branquinho, do Departamento de Ciências Sociais e Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). Ao analisar as manifestações carnavalescas dos Papangus de Bezerros e dos Tabaqueiros de Afogados da Ingazeira, Maria das Graças – que já havia pesquisado os Caretas de Triunfo no mestrado, também no PPGA – identificou que as máscaras mesclam sentimentos de segredo, medo, vaidade e prazer.
Construindo uma cartografia, ela detectou a existência dos mascarados carnavalescos nos 185 municípios do Estado. Dentro desse universo pesquisado, como referencial empírico para um estudo mais aprofundado sobre os folguedos, a professora optou por analisar os dois municípios por suas características diferenciadas em relação ao processo de construção identitária dos lugares: enquanto Bezerros, Terra dos Papangus, oferece um Carnaval já consolidado, com forte presença de turistas, a festa de Afogados da Ingazeira, Terra dos Tabaqueiros, ainda é mais conhecida apenas nas redondezas, apesar de estar crescendo a cada ano. “Conhecer e caracterizar de uma forma geral as máscaras usadas nas manifestações populares torna-se uma possibilidade de aprofundar o conhecimento sobre os habitantes dos lugares e as relações que permeiam as brincadeiras”, explica.
Em Bezerros, no Agreste pernambucano, a 105 quilômetros do Recife, os brincantes usam fantasias coloridas e máscaras de formas variadas, sempre buscando manter o anonimato. Já em Afogados da Ingazeira, no Sertão do Pajeú, a 378 quilômetros do Recife, a brincadeira consiste em usar chicotes nas mãos e chocalhos na cintura além das máscaras. “A máscara torna-se elemento de suma importância para a vivência da pândega carnavalesca, trazendo a possibilidade do anonimato e de uma vida temporária regada de simbolismo”, afirma.
Na pesquisa, Maria das Graças usou a metodologia de história de vida com os mestres Lula Vassoureiro, em Bezerros, e Beijamim Almeida, em Afogados da Ingazeira. Além desses contatos mais aprofundados, foram realizadas entrevistas com os próprios brincantes, com representantes do poder público local e estadual e com visitantes de cada cidade. Também foram selecionados hotéis, pousadas e bares em cada município para aplicação de questionários sobre o contexto social, econômico e cultural.
A cartografia dos mascarados pernambucanos, por sua vez, foi elaborada em visitas aos municípios, através de pesquisa bibliográfica e documental sobre os folguedos, contatos telefônicos com diversas instituições municipais e telefones particulares dos gestores, troca de e-mails com moradores e funcionários das Prefeituras, bem como pesquisa em sites institucionais e blogs sobre as cidades. “Importou-me visualizar o movimento existente na realidade investigada, construindo o conhecimento científico a partir dos atores de um coletivo múltiplo, formado por humanos e não-humanos. Todos esses elementos foram percebidos e destacados a partir da reflexão sobre os direcionamentos trazidos pela teoria ator-rede (ANT), difundida no âmbito da Antropologia das Ciências e as Técnicas pelo filósofo francês Bruno Latour”, explica.
O medo, o segredo, o prazer e a vaidade foram temas recorrentes nas entrevistas. A análise apontou que o medo se dá pela perturbação que os mascarados provocam e o segredo, pelo ocultamento da identidade. O prazer se revela desde a concepção da máscara, passando pela produção e chegando ao assédio dos visitantes. A vaidade não está apenas no belo, mas também no feio. “O Belo e o Feio, o trágico e o cômico, o alegre e o triste, a ordem e a desordem criam um caleidoscópio: a multiplicação de personagens surge pelas infinitas possibilidades de elaboração das máscaras que dão vida ao imaginário individual e coletivo”, finaliza a autora.
Mais informações
Programa do Pós-Graduação em Antropologia (PPGA) (81) 2126.8286
ppga@ufpe.br/ antropologia.ufpe@gmail.com
Maria das Graças Vanderlei da Costa
grcosta01@yahoo.com.br
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